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O argumento da localidade (do inglês argument from locality[1]) é um argumento contra a existência de Deus que tenta demonstrar que todas as religiões estão incorretas e bem assim os deuses por elas defendidas com vista no seu desenvolvimento histórico (em específico as relações de tempo e local de desenvolvimento) e suas origens. Trata-se de um argumento similar ao falacioso argumento genético de Dawkins.

Apresentação e defesa[]

O argumento é aparentemente novo e foi originalmente publicado num artigo intitulado The Argument from Locality - A new anti-theistic contention, do autor do site ateísta Ebon Musings: The Atheism Pages.[2] Entre os seus defensores públicos encontra-se o famoso novo ateu Cristopher Hitchens.[1]

A wiki ateísta Iron Chariots Wiki "definiu" o argumento da seguinte maneira:[1]

O argumento da localidade afirma que todas as religiões que já existiram ou irão existir tiveram uma origem num lugar e tempo específico dentro de uma cultura específica. Qualquer deus ou deuses que verdadeiramente desejaria que todos os seres humanos o seguissem logicamente poderia ter iniciado a sua religião no mesmo instante em que a raça humana apareceu e teria informado todas as culturas, não apenas uma, assim dando a todos os humanos que nasceriam uma chance igual de ingresso [na religião]. O fato de que nenhuma religião jamais fez isso mostra que nenhuma religião é "a correta" - ou, pelo menos, que nenhuma religião até agora teve uma divindade "racional".

Versão geral[]

  1. Qualquer deus que quisesse que todos os seres humanos O seguissem teria se revelado a todos os humanos de uma vez, não a apenas uma cultura ou raça por vez.
  2. Se recompensa e punição são dados para crença e descrença respectivamente, então qualquer deus que espera milhares de anos antes de se revelar aos seres humanos é injusto, uma vez que as pessoas que viveram e morreram antes da revelação não tiveram a chance de acreditar.
    1. Se crentes são recompensados pela sua crença então é injusto que apenas um único grupo específico de pessoas recebam mais evidência do que as demais.
    2. E vice-versa: se descrença é punida então também é injusto para algumas pessoas receberem menos evidências do que as outras (ou nenhuma).
  3. Qualquer religião que fortemente reflete as crenças e pensamentos do tempo em que foi criada não é a "verdadeira".

Versão cristã[]

  1. Deus se revelou apenas para os judeus primeiramente. Ele era o deus dos judeus e de ninguém mais. Ele só se tornou o deus do mundo depois que o Cristianismo veio.
  2. Apesar de o Cristianismo alegar que é o desejo de deus salvar todos os que O seguirem, ele ainda assim esperou milhares de anos antes de revelar o seu plano à humanidade. Mais, a razão pela qual ele de repente decidiu salvar todos os seres humanos ao invés de apenas os judeus nunca foi explicada — assim ficando injusto para os milhões de não-judeus que viveram antes de Cristo, que nunca tiveram uma chance de serem salvos.
  3. O Deus cristão recompensa os crentes. Assim, o fato de que ele apenas se revelou a um grupo pequeno de pessoas no Oriente Médio 2,000 anos atrás e deixou para os humanos espalharem a sua palava é muito injusto da sua parte.
  4. Descrença é punida, o que reforça a injustiça de apenas dizer a um grupo pequeno de pessoas.
  5. A Bíblia fortemente reflete as crenças e pensamentos do seu tempo (e.g. uma terra plana, mulheres serem inferiores aos homens, escravidão, etc.).

Avaliação[]

Tendo em vista a exposição da Iron Chariots Wiki, pode-se concluir que o argumento é inválido em tentar demonstrar, mesmo que indutivelmente, que Deus não existe ou que Ele não é racional se considera-se uma defesa cristão (em outras palavras, não é conhecido se é possível responder ao argumento partindo como premissa a veracidade de outra religião).

Versão geral[]

Esta seção será direcionada à versão do argumento em três premissas encontrada na Iron Chariots Wiki, onde a primeira parte consiste na alegação de que, se qualquer Deus existisse, Ele iria procurar revelar-se a todos os seres humanos de uma vez independente do tempo ou raça, i.e. de uma forma diferente da qual Ele aparentemente se revelou (i.e. para povos em específico), enquanto que a segunda diz respeito ao tempo do momento em que as alegadas revelações foram feitas e a terceira consiste na alegação de que, na presença de punições por descrença, a revelação tardia representa um ato injusto.

Segue um resumo das objeções e logo em seguida suas explicações:

  1. Primeira premissa
    1. Não necessariamente é verdade: pode haver um motivo pelo qual esse deus desejasse se revelar mais tarde mesmo que isso custasse muitas vidas.
  2. Segunda premissa
    1. O deus não é injusto:
      1. caso ele tenha formulado uma maneira justa de julgar os que existiram antes da revelação (ex.: pelos atos ao invés de pela fé);
      2. caso o sistema de retribuição pela fé tenha vindo após a revelação (o caso do Cristianismo se tomado Adão como quem primeiro recebeu a revelação);
    2. O Deus cristão não é injusto:
      1. O Deus cristão se revelou desde o início da humanidade, de acordo com a primeira premissa (Adão e Eva);
  3. Terceira premissa
    1. A premissa está descontextualizada;
    2. Apesar de estar ao final do argumento, é uma premissa, não um conclusão (i.e. não se trata de um argumento muito embora seja chamado como um);
    3. É uma falácia genética;
    4. Mesmo que não fosse, sua validade é falsa, pois refletir a crença de um momento não implica em falsidade caso aquelas crenças esteja certas (neste caso, argumentar que se trata de uma "fraude" ou semelhante é falso, já que está de acordo com os padrões de revelação).
      1. Não é o caso do Cristianismo.

Primeira parte[]

A alegação contida na dita primeira premissa do argumento é dúbia e dificilmente é verdadeira. A alegação de que "qualquer deus que desejasse que todos os seres humanos O seguissem iria ter se revelado a todos os seres humanos de uma vez, não apenas a uma cultura ou raça num momento" não passa de pura conjectura, não apenas porque trata de um "chute no ar" sobre o que um Deus nesta circunstância faria (uma alegação que, como não segue dedutivamente, só poderia ser atestada com base em onisciência, o que significa que o argumento já inicia com uma premissa "quebrada"), mas porque mesmo que a alegação fosse verdadeira, poderia muito bem haver um motivo porque, mesmo que Deus realmente desejasse fazer isso, Ele não viria a fazê-lo. Por exemplo, pode ser que Deus, na sua onisciência, preveu que não adiantava mostrar-se à raça humana antes da época em que Cristo veio ao mundo, mas antes pelo contrário isso só traria problemas, e por esse motivo Deus não se mostrou até aquele momento. Como seria necessário da parte do ateu demonstrar que não existe nenhum motivo pelo qual Deus faria isso para desacreditar esta objeção, e tal ação requer onisciência ou quase isso, fica inviável para qualquer defensor do argumento demonstrar que Deus não possuia nenhum motivo "superior" pelo qual se revelou mais tarde apesar de desejá-lo fazer mais cedo.

Há também a consideração de que o conceito do Deus cristão inclui Sua onisciência e, se temos que a primeira premissa é verdadeira e que mesmo assim Deus só se revelou posteriormente (o que, vale ressaltar, não é o que o Cristianismo defende), então só temos a concluir que de fato havia um motivo que nós não conhecemos pelo qual Deus agiu desta maneira imprevista. No caso desta resposta, conclui-se que a discussão prossegue para outros argumentos, i.e. o argumento da localidade torna-se incapaz de demonstrar a inexistência de Deus e a questão vai depender da validade de outros argumentos para a questão ser decidida. Por exemplo, se um ateu demonstrasse que é impossível que um Deus onisciente exista, então esta resposta poderia ser posta em descrédito.

Segunda parte[]

No caso do Cristianismo e do Judaísmo, todavia, assumir a primeira premissa não é problema, tendo em vista que ambos defendem que Deus já se revelou ao ser humano nos seus primórdios, em Adão e Eva, e que portanto agiu perfeitamente de acordo com a primeira premissa. A alegação de que as revelações só vieram no Judaísmo em Moisés e no Cristianismo em Jesus, anos depois, não reflete os ensinamentos bíblicos e daí pode ser descartado. Obviamente esta resposta não é válida para aqueles que não crêem na existência literal (ou quase literal, i.e. de algo parecido) com Adão e Eva.

Como complemento vale lembrar que, mesmo que considerasse a alegação da revelação de Deus ter ocorrido somente em Cristo (o que seria uma resposta mais viável para aqueles que não defendem a literacidade do Gênesis), o argumento ainda é incapaz de refutar a existência do Deus cristão. Neste ponto, nota-se que a Bíblia aparentemente não ensina o motivo pelo qual Deus esperou até o ano 30 d.C. para definitivamente revelar-se à raça humana (possivelmente justamente porque ela/Deus considera a revelação como tendo sido dada em Adão), mas desde Gn 3:16 e em várias outras passagens que são profecias messiânicas Deus deixou claro que haveria um tempo entre Adão e a revelação em Cristo, o que significa que o assunto não é simplesmente ignorado. Partindo com o pressuposto da onisciência de Deus já exposto num ponto anterior, pode-se inferir com segurança que Deus não fez nada errado em "adiar" a Sua revelação até à época de Cristo.

Neste segundo ponto, a questão poderia ser modificada não mais para se Deus fez algo errado, mas se Deus fez a melhor coisa a ser feita - o que seria apresentado como algo esperado de um ser benevolente. Neste caso, o filósofo e apologista William Lane Craig defende que Deus não fez uma má escolha ou algo realmente ruim em revelar-se em Cristo somente naquela época e não antes, uma defesa que aliada à não-obrigação de Deus de dar-nos a salvação (veja próxima seção), retira dEle qualquer acusação apontada no argumento. A análise de Craig considera os seguintes fatos:[1]

  1. A população antes de Jesus não era muito grande (se pessoas morreram sem a salvação, não foram tantas);
  2. Jesus apareceu apenas antes da explosão populacional exponencial (se Deus tivesse se demorado, o argumento seria mais considerável);
  3. As condições da época eram estáveis e adequadas.

As considerações de Craig são largamente aceitas pela maioria dos teólogos e são fundamentadas na predição bíblica de que o Messias viria no tempo escolhido, um tempo apropriado para a Sua vinda.[fonte?] Em outras palavras, não consistem apenas numa resposta ao argumento, mas também consistem no cumprimento de uma profecia messiânica. Observa-se que a vinda de Jesus exatamente antes da explosão populacional serve não apenas como resposta, mas como indicação de que Deus sabia o que estava fazendo e estava no controle - comprovando a resposta de confiarmos na onipotência de Deus.

Críticos lançaram objeções fúteis às respostas de Craig.[1]

Terceira parte[]

Pode-se também questionar a idéia de que uma revelação tardia seria injusta caso haja punição pelos atos ou descrença em pelo menos duas facetas.

Na primeira, considera-se a idéia de justiça como podendo estar sendo má-interpretada. Isso pode ocorrer porque não existe base bíblica alguma para inferir que a justiça de Deus seja nos mesmos termos que a justiça comum humana, de forma que alegar que Deus seria injusto caso fizesse ou deixasse de fazer algo com base me nossa justiça e ligar esta alegação com a alegada justiça de Deus sempre consistirá numa alegação dúbia, indigna de crédito prático.

Por outro lado, lembra-se que o Cristianismo ensina que Deus não nos deve nada: nem a salvação é sua obrigação, antes vindo por graça. Mesmo considerando a primeira premissa como verdadeira, Deus não possui obrigação nenhuma de segui-la e assim conformar-se com o argumento (i.e. mesmo que a vontade de Deus de que todos sejam salvos implicasse que Ele iria preferir uma revelação global, ainda assim Ele pode livremente decidir-se por não fazer tal revelação baseado no fato de que Ele não possui nenhuma obrigação real de revelar-se desta maneira). Desta forma, mesmo que não haja razão prática alguma para Deus deixar de se revelar genericamente, não há boa base para alegar que haja um erro na questão envolvendo Deus; tal erro só poderia ser apontado caso houvesse alguma obrigação por parte de Deus.

Premissa desconexa[]

Observa-se finalmente que a terceira premissa é desconexa com o resto do argumento: as duas primeiras dizem respeito sobre a justiça ou injustiça de um deus em relação à sua revelação aos seres humanos, enquanto a última diz respeito ao surgimento de religiões em relação ao seu contexto. Esta premissa também é errada porque trata-se de uma falácia genética e o fato de que uma religião reflete os pensamentos do seu tempo não significa que não seja verdadeira, pois estes "pensamentos do seu tempo" podem ter sido equivocadamente modificados. Por outro lado, como isso não é o caso do Cristianismo então não há porque se preocupar.

O argumento no Cristianismo[]

A versão específica para o Cristianismo presente na Iron Chariots Wiki[1] falha não só nas mesmas críticas anteriores, como em outras.

Segue um resumo das objeções:

  1. Primeira premissa
    1. De acordo com o Cristianismo, a premissa é falsa porque Deus se revelou primeiramente a toda a humanidade através de Adão.
    2. Deus não era apenas o deus dos judeus: outros povos também O conheciam, e.g. Jetro, sogro de Moisés, era midianita e servia a Deus; sabe-se que os cananeus sabiam quem Deus era, etc.
    3. Deus sempre foi o "deus do mundo" em certo sentido; a salvação era, todavia, quase que restrita aos judeus porque o resto do mundo realmente não queria saber dEle;
  2. Segunda premissa
    1. Mesmo erro da primeira premissa;
    2. A razão é explicada; o que há é falta de teologia;
    3. Todos tem uma chance de serem salvos baseados no testemunho do Espírito Santo;
    4. Não seria injusto caso alguns não tivessem chance à salvação, já que Deus não deve nada a ninguém e a salvação é pura graça.
  3. Terceira premissa
    1. Mesma linha de erro dos casos anteriores.
    2. Não é injusto pois é graça; ninguém merece e já foi muito que alguns receberam.
  4. Quarta premissa
    1. Mesmas considerações da terceira premissa.
  5. Quinta premissa
    1. Trata-se de uma premissa flutuante.
      1. Argumento mal-formulado.
    2. Carece de conclusão, logo não é um argumento.
    3. Falso, em especial com relação aos exemplos dados.
Primeira premissa

Por exemplo, a alegação da primeira premissa ("Deus se revelou apenas para os judeus primeiramente. Ele era o deus dos judeus e de ninguém mais. Foi só no Cristianismo que ele se tornou o Deus do mundo.") cai na menção da revelação primária de Deus em Adão e Eva, anterior à revelação aos judeus (esta mesma só tendo ocorrido como consequência de manter-se a revelação de Adão, passada por patriarcas como Noé até chegar em Abraão). Mais do que isso, esta primeira premissa também falha no dado histórico de que Deus era apenas dos judeus "e de ninguém mais" antes do Cristianismo, já que havia outras pessoas que também criam em Deus apesar de não serem judeus, como Jetro, sogro de Moisés, que era midianita, um povo pagão.[fonte?]

Segunda premissa
Última premissa

A última premissa é definitivamente incorreta, pois a alegação de que a Bíblia reflete a situação histórica do seu momento é notoriamente falsa - tanto que a alegação oposta é justamente usada como evidência da inspiração da Bíblia! Os exemplos apresentados revelam justamente a falsidade da alegação: 1) a Bíblia nunca ensinou que a Terra é plana, sendo este um dos mais antigos mitos a seu respeito;[3] 2) a inferioridade da mulher em relação ao homem não é ensinada na Bíblia - ou ao menos não no sentido que era usual na época inclusive para os personagens bíblicos; e 3) a escravidão não é defendida pela Bíblia como os ateus alegam, e mesmo que fosse não seria como era defendida na sua época.

Notas

Referências

  1. 1.0 1.1 1.2 1.3 1.4 1.5 Argument from locality (em inglês). Iron Chariots Wiki. Página visitada em 11 de junho de 2010.
  2. The Argument from Locality - A new anti-theistic contention (em inglês). Ebon Musings: The Atheism Pages. Página visitada em 11 de junho de 2010.
  3. The Earth is flat (em inglês). Sceptic Wiki. Página visitada em 11 de junho de 2010.
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